Quem é o pesquisador Paulo?
Sou Paulo Henrique
de Figueiredo, 49 anos. Por formação, atuo como administrador de empresas, mas
desde jovem tenho sido pesquisador, divulgador e palestrante do Espiritismo, em
conferências e seminários por todo o Brasil.
Nasceu
em berço espírita ou veio depois?
Venho de uma
família espírita atuante na divulgação do espiritismo desde meus avós. Desde a
infância estive perto de médiuns, palestrantes e estudiosos espíritas, como
Chico Xavier, Martha Galego, Herculano Pires, Jorge Rizzini, entre outros.
Você já tinha um trabalho histórico nessa área.
As obras de Kardec
estavam presentes no cotidiano. Posteriormente, por mais de cinco anos
mantivemos nas bancas uma revista espírita, a Universo Espírita. Também iniciamos um programa de rádio com o
mesmo nome, que já tem mais de quinze anos, sendo veiculado em diversas rádios.
Minha pesquisa sobre o espiritismo rendeu a publicação da obra “Mesmer, a
ciência negada e os textos escondidos”, que já recebeu três edições e será
relançada ainda este ano. Mas esse livro era parte de uma pesquisa ainda mais
ampla, pesquisei o magnetismo animal, em verdade, para compreender o
espiritismo! O resultado de mais de duas décadas de estudos em fontes primárias
resultou em “Revolução Espírita – a teoria esquecida de Allan Kardec”, lançada
agora neste mês de junho de 2016.
Como
se interessou pelo tema?
Desde pequeno, as
obras de Kardec estavam espalhadas pela casa de meus pais. Mas foi a coleção da
Revista Espírita que me chamou muito a atenção. Nessas revistas publicadas por
Allan Kardec mês a mês, desde 1858, pude conhecer o dia a dia de seus trabalhos
de comunicação com os espíritos e os debates na Sociedade Parisiense. Nas obras
básicas, os textos são conclusivos e literários. Na revista, vemos o professor
Rivail em plena atividade de pesquisa, debatendo temas, interpretando e comparando
mensagens, respondendo a polêmicas, propondo questões instigantes e
esclarecedoras aos espíritos, relatando suas viagens, encontros, dando
instruções às centenas de grupos de estudos com os quais se correspondia.
Fiquei maravilhado com aquela viagem no tempo.
E o
magnetismo?
Certo dia, me
deparei com a seguinte afirmação de Kardec: “O Magnetismo preparou os caminhos
do Espiritismo, e os rápidos progressos dessa última doutrina são,
incontestavelmente, devidos à vulgarização das ideias da primeira”. Em seguida
considerou que Magnetismo Animal e Espiritismo eram ciências irmãs, até mesmo
gêmeas! Por fim, sentenciou: “sua conexão é tal que é, por assim dizer,
impossível falar de um sem falar do outro. Se devêssemos ficar fora da ciência
magnética, nosso quadro estaria incompleto”. Fiquei muito intrigado com aquelas
palavras. Pois questionei as mais diversas pessoas do meio espírita e ninguém
sabia explicar do que tratava a ciência do magnetismo animal! E então pensei:
Mas se Kardec afirmou que não é possível compreender o Espiritismo sem sua
ciência irmã, hoje ele deve estar incompleto. Parti então em busca dos
significados da ciência criada por Franz Anton Mesmer, o médico alemão que
criou a proposta de renovação da medicina por meio de sua descoberta, o
tratamento pelos passes e imposição de mãos.
Outros
pesquisadores também foram parte da base precursora do Espiritismo?
Junto com o
professor e escritor da Faculdade Paulista de Medicina, Dr. Álvaro Glerean,
procedemos à tradução e estudo das obras de Mesmer, e de mais de uma dezena de
autores clássicos que o sucederam, como Puységur, Deleuze, Du Potet, Ricard,
entre tantos. Foram mais de vinte obras. Nos debruçamos também nos jornais e
revistas dos magnetizadores, e também os autores que contestavam essa nova
ciência. Todo esse trabalho foi dedicado a recuperar a ciência irmã do
espiritismo, para compreender quais conceitos e valores complementavam o
entendimento da doutrina espírita, como explicou Kardec.
Qual
é foco da pesquisa contida no livro que lançou agora?
Achamos tão rico e
valoroso o legado de Mesmer, que, ainda em meio à pesquisa, publicamos o livro
“Mesmer”, para colocar a público aquelas interessantes informações. Mas
continuamos nosso trabalho. Avançando no tempo, buscamos compreender o meio dos
magnetizadores quando do surgimento dos fenômenos espíritas, a repercussão
dessa novidade, os grupos de magnetizadores que passaram a dialogar com os
espíritos, os debates e questionamentos dede 1849 em Paris, mais de cinco anos
antes do professor Rivail ouvir falar das mesas girantes! Depois continuamos
essa volta no tempo, buscamos conhecer a família de Rivail, sua infância na
cidade natal, Bourg-em-Bresse, os primeiros passos em Paris, e todo o período
de elaboração da doutrina espírita. O resultado dessa ampla e minuciosa
abordagem resultou no livro “Revolução Espírita”.
Por
que revolução?
Essa detalhada
pesquisa revelou que quando o “Livro dos espíritos” chegou às livrarias, havia
um público bastante preparado para compreender o que de novo estava sendo dito
pelos espíritos nessa obra. O magnetismo animal estava presente na cultura e
nos hábitos sociais, haviam consultas e diagnósticos com sonâmbulos,
praticamente todos os homeopatas aplicavam tratamentos por passes, haviam
consultórios e até hospitais mesméricos. Uma ampla literatura tratava da
ciência do Magnetismo Animal. Também a Universidade, nas áreas de humanas,
notadamente na filosofia e psicologia, como relato amplamente no livro,
adotavam uma orientação espiritualista, era o que se conhecia como
espiritualismo racional. Quem havia estudado essa matéria no colégio ou
faculdade, tinha todo um questionamento, um cabedal de dúvidas, pronto para
receber a teoria dos espíritos como resposta lúcida, inovadora e
revolucionária! Kardec percebeu a grandiosidade desse movimento, e afirmou:
“Uma revolução nas ideias certamente produz outra na ordem das coisas. É essa
revolução que o Espiritismo prepara”. E foi exatamente essa revolução nas
ideias que encontramos em nossa pesquisa e apresentamos de forma acessível em
nosso mais recente livro. E ouso dizer, são conceitos que podem ser recebidos
como uma grata novidade pelo movimento espírita atual. Poderia dizer que:
aquele que busca novidades em Kardec vai certamente vai encontra-las, na teoria
esquecida desse renomado professor!
Por
que Kardec continua desconhecido ou ignorado pela historiografia?
A pesquisa biográfica
sobre Allan Kardec foi produzida por pesquisadores minuciosos, como Zeus
Wantuil, no século 20. Nesse tempo, o acesso a documentos originais e outras
fontes primárias era muito difícil e precário. O interesse atual pela história
e o acesso à informação pela internet é um marco na evolução da cultura humana.
A Europa investe muito nesse campo. Hoje temos acesso a jornais, revistas,
livros e documentos, de cada cidade, em cada uma das fases históricas.
Descobrimos que importantes brechas e até informações equivocadas estão
estabelecidas no senso comum da biografia de Kardec e até mesmo na
interpretação da doutrina espírita. Enfrentar a recuperação desses valores, sem
ideias preconcebidas, sem a intenção de encontrar o que se imagina ser o certo.
Ter a mente aberta para compreender o que ocorreu, independente de opiniões
pessoais. Olhar para o passado sabendo que havia uma cultura naquela época
muito diferente da atual, e que o olhar de hoje é diferente de quem viveu nesse
passado. Esses são alguns dos cuidados necessários para produzir uma nova
historiografia espírita. Pensamos em tornar a obra “Revolução Espírita”, uma
contribuição nesse sentido. Um tijolo nessa construção.
O
Espiritismo continua um novo paradigma ou está desatualizado?
Os espíritos que se
propuseram a transmitir a Kardec e demais pesquisadores que compunham as
sociedades de estudos espíritas uma doutrina revolucionária e transformadoras
compreendem as leis naturais que regem o mundo espiritual com profundidade e
clareza. Uma amplidão longe de nossa capacidade de entendimento. Por isso, eles
agiram e agem de forma pedagógica adequada, deixando que estejamos conscientes
das dúvidas para apresentar o caminho dos ensinamentos. É preciso partir do
conhecido para o desconhecido. Esse trabalho de construção dos conceitos
espíritas é contínuo e progressivo. Não houve continuidade desse diálogo amplo
e diversificado, por meio de médiuns independentes e em grande número, por
grupos esclarecidos, como ocorreu em torno de Rivail de 1857 a 1869. Houve uma
ruptura. A doutrina espirita está presente nas obras de Kardec, incluindo com
grande importância as Revistas Espíritas, e precisa ser resgatada com os
recursos imprescindíveis da História e Filosofia das Ciências. Muitas das
respostas para a crise moral e intelectual que atualmente a humanidade passa
estão presentes na Doutrina Espírita. No entanto, esses valores fundamentais
estão atualmente fora dos debates, das palestras, dos cursos, enfim, do
repertório de temas do movimento espírita. O espiritismo é uma doutrina
revolucionária, de vanguarda, atual, surpreendente; mas quem não conhece seus
conceitos fundamentais originais, é quem está desatualizado. E, como afirmou
Herculano Pires, o Espiritismo ainda hoje é o “grande desconhecido”.
O que os espíritas e não espíritas podem
esperar da sua obra?
Não caberia aqui
reproduzir as descobertas, os dados inéditos, os questionamentos propostos
amplamente apresentados na obra “Revolução Espírita”, a isso remetemos à sua
leitura. O que dizemos é que esse livro é o que eu gostaria de ter em mãos,
quando fui instigado pelas afirmações de Allan Kardec. Foram duas décadas de
mergulho no passado, lendo milhares de obras, revistas, jornais e documentos.
Procuramos oferecer como fio condutor da obra uma biografia romanceada do
professor Rivail baseada exclusivamente em fontes primárias. O pano de fundo
dessa narrativa é a história da França. Mas as descobertas e ideias de Allan
Kardec vão sendo esmiuçadas, debatidas e apresentadas no contexto de seu tempo,
para que o leitor nos acompanhe nessa viagem no tempo. A pergunta é a seguinte:
O que teria entusiasmado um intelectual francês a reconhecer na teoria espírita
o potencial de transformar o mundo? Esperamos ajudar com “Revolução Espírita” o
leitor a encontrar essa resposta, seja ou não espírita.
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