quarta-feira, 21 de abril de 2010

O Céu de Brasília


Para os arquitetos Renato Caetano e Eugênio Lara


Este ano Brasília comemora 50 anos da sua inauguração em 1960. Foi o acontecimento do século para a arquitetura brasileira e do milênio para os habitantes do mundo astral, sobretudo os Espíritos que vivem na Metrópole do Grande Coração e na Cidade Espiritual Brasil. Foi desses dois núcleos, segundo relatos mediúnicos, que partiram a idéia e as inteligências que idealizaram, planejaram e materializaram a Nova Capital. São entidades de grande experiência social (Espíritos muito antigos), de perfil humanista, místico e universalista. Quando encarnam, manifestam em suas tarefas as vocações e habilidades de alto impacto coletivo, devido ao seu enorme potencial realizador. Não são seres iluminados, de sublimação angélica, mas espíritos humanos, práticos e generosos, depurados no curso dos séculos e sempre envolvidos em projetos sociais renovadores. Quando encarnados logo se revelam como gênios predestinados a realizar grandes mudanças. Apresentam-se comumente como "ateus" e provocadores de dogmas, mas no fundo no fundo, cultivam uma espiritualidade acima da média humana, que muitos de nós não conseguem compreender ou experimentar. Mesmo na militância política ou nas profissões públicas, não se corrompem porque sabem fazer as escolhas que os mantém nas linhas transformadoras da responsabilidade. Quando erram, assumem prontamente suas faltas como parte do risco idealístico e logo se comprometem a corrigí-las em novas empreitadas sociais. A mini-série JK, dirigida por Dênis Carvalho, captou e expressou bem essa dimensão e a trama espiritual que se ocultava por trás dos personagens e acontecimentos históricos liderados por JK e seus velhos conspiradores, agora reencarnados no papel de assessores técnicos, artistas e políticos. Ele, com suas fortes idéias utópicas, foi o principal ponto de atração, uma espécie de sol que atraia mentes e irradiava realizações. Oscar Niemeyer, juntamente com Lúcio Costa, foi uma dessas inteligências empreendedoras e relata como foi seduzido por Jk. Depois fez o mesmo em relação aos seus companheiros:

“E pra lá segui com meus colaboradores. Não pensava levar apenas arquitetos e convidei outros amigos – um médico, dois jornalistas e quatro camaradas que não cuidavam de arquitetura. Estavam sem trabalho, eram inteligentes e divertidos, e compreendi ser o momento de ajudá-los. Eu não gostaria de passar as noites de Brasília a falar de arquitetura – para mim um complemento da vida, muito mais importante que ela”.

Juscelino Kubtschek sabia que o Rio de Janeiro tinha a imagem secular de “capitalidade”, mas era apenas uma questão política. Reuniu os conspiradores em todas as áreas estratégicas e partiu para o aliciamento, sobretudo nos setores que poderiam ser mais resistentes. Queria ter em pouco tempo, antes que os ventos das mudanças passassem, a capital instalada no cerrado, o novo ponto de partida da interiorização: “Quero uma capital moderna, a mais bela do mundo”, disse para Niemayer em 1957. E teve, apesar da intensa campanha contrária dos reacionários da Guanabara, comandados por Carlos Lacerda. O mais famoso arquiteto do mundo não se cansa de contar inúmeras vezes a mesma história, que não parece a mesma porque sempre dá um tom poético e místico nas suas narrativas memoriais. Lembrando o rápido e assombroso parto da cidade dos seus eterno sonhos, ele diz:

“ Tarde, uma ou duas horas da madrugada, JK nos acompanhava na saída. E aí nos retinha, empolgado com a noite de Brasília. O céu imenso, cheio de estrelas, o palácio já erguidos a se destacarem com suas formas brancas na enorme escuridão do cerrado. Mansamente, como ame dizer um segredo, JK tomava-me pelo braço: ‘Niemayer. Que beleza!’ “


sábado, 10 de abril de 2010

Rohden, os teólogos e o Espiritismo

O fenômeno humano e a educação, principais focos das reflexões de Huberto Rohden


O professor Huberto Rohden é conhecido de longa data dos espíritas e espiritualistas por seus textos lúcidos e admiráveis sobre a filosofia cristã. Reflexo das suas experiências no clero – Rohden era padre jesuíta – e também das inúmeras incursões nas escolas iniciáticas orientais, seu pensamento naturalmente se desdobra para a educação, campo que foi para ele o mais significativo, já que seu objetivo maior era a transposição dessas idéias para a práxis. “Ninguém educa ninguém, pois a educação é intransitiva e o ser humano é imprevisível”, repete Rohden em diversos ensaios.

Comentando a Parábola do Semeador - espelho espiritual dos educadores e pedra angular do Livre Arbítrio - Rohden diz que Jesus conseguiu educar todos os seguidores que se abriram para as novas experiências, transformando discípulos em apóstolos. Sobre essse fenômeno pedagógico, ou melhor, andragógico, ele explica que Judas, o mais intelectual dos discípulos mais próximos, foi o único que não conseguiu ser educado. Mais interessado na política judaica nacionalista, não permitiu que isso ocorresse. Jesus logo percebeu essa sua “esterilidade espiritual” ou egocêntrica, deixando que o tempo mudasse sua natureza. Paulo de Tarso teve o mesmo problema. Ambos seriam "salvos" por suas mediunidades. Cada um no seu ritmo, cada um no seu tempo.

Numa determinada época da sua militância, Rohden teve que desligar-se da Igreja e, ainda sob a proteção de amigos jesuitas, estudou em diversos países europeus e ensinou em universidades americanas. Também viajou muito pelos cenários místicos da Ásia, que sabia ser a principal raíz histórica das concepções religiosas que hoje predominam no Ocidente. Se orgulhava muito de ter convivido com Albert Einstein durante sua estadia na Universidade de Princenton, não como motivo de vaidade, mas de espanto ao constatar no dia-a-dia a genialidade e o modo de vida simples e tranquilo do grande revolucionário da Física. Todas essas experiências seriam registradas em ensaios publicados inicialmente pela Editora Vozes, de orientação católica, e depois pela sua própria organização educacional, fundada em São Paulo na década de 1950. Além dessas publicações, a Fundação Alvorada oferecia regularmente cursos aos leitores interessados no aprofundamento das idéias e práticas “univérsicas”, um interessante conjunto de conhecimentos unindo a tradição espiritual e a modernidade científica contemporânea.

Sabe-se que o célebre filósofo catarinense teve grande influência do também padre jesuíta Pierre Teilhard Chardin que – como ele – extrapolou os limites da clericalidade conservadora para mergulhar nas novidades antropológicas da paleontologia. Chardin buscava Adão e Eva fora da teoria mitológica da Bíblia e também da simplificação zoológica evolucionista. Ambos naturalmente caíram na heresia e isso de certa forma os assemelhou aos pensadores espíritas. O mesmo ocorreu com Pietro Ubaldi, médium de sintonia fina raríssima e crítico da teologia das igrejas cristãs . Como todo bom jesuíta, Rohden queria entender o fenômeno humano e compreender, ou pelo menos se aproximar, da natureza que ele denominou “misteriosa”, tal qual a natureza do Criador. “O mistério, do grego mystés, é tudo que transcende a zona empírica dos sentidos e o mundo do intelecto”, afirma ele, ao comentar um dos versículo do apócrifo “Evangelho de Tomé”, encontrado no Egito em 1941.

Nos textos de Rohden não encontramos nada que se refere aberta e objetivamente à existência do espírito, como fenômeno científico observável, ser individual pensante e sobrevivente da morte, com propôs Kardec. Rohden também não fala em reencarnação, assunto que ele admitia não aceitar, por limitação ideológica. Sobre a pluralidade de mundos, afirmava que este era um assunto óbvio, pela própria natureza do universo. No entanto, quando discorre sobre os temas clássicos da mística filosófica judaico-cristã (que ele distingue do misticismo pagão) explica com habilidade impressionante os fenômenos psicológicos resultantes da revolução existencial humana durante as peripécias do Espírito na carne.

Ná década de 1950, o professor foi um dos convidados históricos de Edgard Armond como conferencista de outras agremiações religiosas e filosóficas que se apresentaram na FEESP. Não via o Espiritismo como escola filosófica bem delineada e por isso não vislumbrava sua expressão como práxis social. Quando refletiu sobre isso, demonstrou uma grave preocupação com o futuro da doutrina, se referindo ao risco de sectarismo que já contaminava a juventude do nosso movimento. Para ele o Espiritismo cairia num gravíssimo erro se fosse transformado numa teologia, pois iria certamente se distanciar da verdadeira mensagem do Cristo. Seria o mesmo erro histórico dos católicos e protestantes ao elegerem a crença nos dogmas como ponto máximo da realização espiritual, abandonando o esforço individual. Trocaram os fins pelos meios. Numa conferência gravada em 1978, Rodhen diz em tom irônico: "Crer na caridade e na reencarnação não é condição essencial ou finalidade da nossa existência. Crer nos Santos , na Missa e no poder do Sangue de Jesus também não são finalidades e sim meios de realização espiritual".

Em “Novos Rumos para a Educação”, ele aponta o trabalho de Kardec como o mais aceitável elo histórico entre a modernidade e a antiguidade cristã, desde que não se enveredasse pelo fanatismo teológico-religioso e também pelo sectarismo partidário filosófico. Certa vez citamos uma interpretação sua de algumas parábolas de Jesus durante uma palestra num centro espírita. Alguém da platéia (e também do stablishment ) se sentiu ofendido e nos “lembrou” que as interpretações “espíritas” de Cairbar Schutel eram “muito melhores”, pois ele era um “verdadeiro espírita”. Naquela momento ficamos divididos entre a decepção e a tristeza e pudemos compreender exatamente o que Rohden quis dizer sobre os perigos do sectarismo. Sentimos vergonha do rótulo “espírita”. Se tivéssemos falado de Spinoza, Hegel, Heideger ou Kant, provavelmente ninguém teria coragem de reagir. Mas como falamos de algo simples e que repercutiu imediatamente na ferida emocional da platéia, logo veio o troco.

Aliás, é incrível como fazemos um tremendo esforço para inserir filósofos e educadores clássicos no universo espírita, como se isso fosse melhorar a aceitação do Espiritismo entre os intelectuais e principalmente entre os orgulhosos. Perda de tempo. O Espiritismo veio para confundir esse tipo de gente, segundo o Espírito Verdade. As religiões e partidos dogmáticos são fundados e perpetuados dessa forma. Seria mais útil se mostrássemos como essas filosofias são limitadas e pobres, pois não conseguem ultrapassar
as barreiras enganosas do pensamento e da vaidade. É por isso que os teimosos nunca mudam de opinião. Somos escravos do pensamento e nos apegamos demasiadamente às idéias, bloqueando as possibilidades ilimitadas das emoções e dos sentimentos. Nessa questão os adultos deveriam agir como crianças e os homens se comportarem como as mulheres. É por isso também que parecemos tolos diante dos verdadeiros sábios, que olham para nós penalizados com tanta ingenuidade. Essa é a sensação que sempre temos ao ler os textos de Huberto Rohden.


Ps. Ainda hoje nos perguntamos: será que Rohden, após sua desencarnação, mudou de ponto de vista sobre a pluralidade das existências?