Decapitação de São Paulo, por Enrique Simonet, 1887
O ex-delegado do DOPS, Claudio Antonio Guerra, do Espírito Santo, fez recentemente revelações bombásticas sobre crimes cometidos por ele, inclusive durante o período da ditadura militar, especificamente na décadas de 1970 e 1980, quando atuava junto às força de repressão. Guerra confessa assassinatos e dá informações sobre militantes de esquerda desaparecidos naquele período, cujos corpos, segundo ele, foram incinerados numa usina de açúcar na região norte do estado do Rio de Janeiro.
As revelações de Guerra foram feitas num livro, em vídeos pela internet e publicadas no portal do IG esta semana. Além dos crimes, o ex-delegado faz revelações sobre personalidades marcantes da repressão, cujas histórias permaneceram obscuras por longos anos. Guerra está sob proteção da Polícia Federal e deverá depor na Comissão Verdade, sobre a lei de anistia e os crimes políticos da ditadura.
Mas o que nos chamou atenção nesse caso é a concepção teológica que o ex-delegado vem realçando em suas declarações.
Preso durante sete anos, Guerra se converteu ao protestantismo e, numa crise natural de consciência, decidiu se livrar do remorso e ingressar na sofrível experiência do arrependimento. Sem dúvida, é um ato até natural, já que aos 71 anos, o novo crente já vislumbra a morte do corpo e certamente o temido encontro consigo mesmo e com algumas vítimas das suas atrocidades, seja em perseguições mentais , seja em confrontos reais com aqueles Espíritos mais vingativos que não conseguem perdoar seus algozes. Este é um caso curioso e didático para aprendermos como funciona esse processo de regeneração psicológica e moral. Não é de se estranhar e é até compreensível que as igrejas também o transformem em modelo e propaganda de conversão.
A culpa e o remorso funcionam inicialmente como vetores das mudanças internas, caracterizadas pelo entusiasmo e euforia. Trata-se do primeiro passo para o arrependimento. Depois vem a fase da tomada de consciência, na qual o devedor sofre o choque de retorno das suas ações. Isso só ocorre de forma positiva e transformadora se realmente houver arrependimento, caso contrário fica apenas como punição ou expiação dos erros, fato que iria ocorrer mais cedo ou mais tarde por força da lei de ação e reação, independentemente da sua vontade ou da sua crença.
Os crimes contra a vida, como nos ensina O Livro dos Espíritos, são os mais graves porque alteram bruscamente os programas reencarnatórios das vítimas e suas complexas ligações familiares e sociais. Nesses casos as reparações são adiadas e não podem ser feitas somente numa existência. O errante deve voltar quantas vezes for necessário para reparar as vítimas diretas ou indiretas dos crimes cometidos.
Na concepção teológica católica e protestante, basta o arrependimento para obter o perdão de Deus. Certamente, se obtém o perdão de Deus, mas isso não significa o esquecimento dos crimes nem das vítimas. Essa idéia individualista da justiça Divina difundida nas igrejas até consola e dá forte esperança aos criminosos, mas não os livra dos choques de retorno. Esses se manifestam por força natural e podem até mesmo serem protelados, caso a Justiça Divina julgue que o criminoso ainda não possui maturidade moral para suportá-los durante a fase de arrependimento. Isso é sintomático. Quando o arrependimento se aprofunda e a consciência desperta, os choques de retorno vêm com mais força, já que o errante já possui condições morais para suportar as cobranças. Isso está claramente advertido nas Bem-Aventuranças do Sermão da Montanha. Não há sofrimento para os inocentes e sim para aqueles que verdadeiramente se arrependeram e se encontram em condições de reparar, seja como for, os seus erros do passado. Não há outra forma de realizarmos o “Sede perfeitos” senão conquistando passo a passo a perfeição relativa e possível aos seres humanos.
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