A dúvida não é somente dos encarnados. Muitos que já passaram para outras dimensões ainda se debatem nessas velhas questões que nos dividem entre o instinto e a intuição, o corpo e a mente, o relógio e a bússola; entre o determinismo e o livre arbítrio; entre o Ser e o existir.
Uma das causas mais comuns do ateísmo e consequentemente do materialismo é a insistente difusão da idéia de que Deus é existência e não Consciência.
A existência é própria de tudo que é mortal e efêmero e não serve como referência para algo que transcende os limites e as manifestações fenomênicas da matéria.
As religiões e filosofias antigas criaram mecanismos intelectuais e dogmas para explicar essas diferenças entre Ser e existir, aplicados ao Ser Supremo e Criador, demonstrando-o com algo abstrato e incompreensível aos sentidos físicos e à razão limitada da experiência humana.
Realmente Deus não existe, pois isso seria restringi-lo aos ciclos de tempo cronológico e no espaço tridimensional. Para que Deus existisse seria necessário conceber a sua origem, bem como seu destino, processo incerto, contraditório e inadequado de análise das coisas que não se enquadram nos paradigmas de causas e efeitos. Deus não existe porque não foi criado; é o Incriado que não teve começo e por isso não tem fim. O Éter sempre foi, sendo inadmissível que a eternidade fosse um ciclo temporal.
Essa tem sido, em síntese, a visão teológica que sustenta a impessoalidade abstrata da Criação, que não é alguém e sim algo que não se pode definir e explicar senão por analogias e figuras de metalinguagem.
A praticidade do budismo e de algumas outras filosofias orientais deixou de lado essas questões e discussões intermináveis para liberar seus adeptos para coisas mais importantes e prioritárias como o auto-conhecimento e a libertação dos rigores da matéria (desejo e ilusão).
O cristianismo, porém, como filosofia nova da passagem da Antiguidade para a Modernidade, insistiu na idéia de criar analogias que pudessem evitar a angústia de não poder explicar o que não tem explicação, alimentando a figura simbólica e humanizada da Paternidade Divina e o dogma da “imagem e semelhança” entre o Criador e suas criaturas.
O Espiritismo, na sua primeira expressão de investigação científica da verdade, típica do século 19 e da pós-modernidade, questiona seus filósofos do Além perguntando “O que é Deus” e não “Quem é Deus”, recebendo do Espírito Verdade e seus colaboradores invisíveis a resposta que não é precisamente resposta, mas que seria a única possível e não contraditória, denominando Deus como uma inteligência que está além da atual capacidade de compreensão humana.
Deus é, portanto, mais uma questão de capacidade de compreensão introspectiva do que propriamente de definição e habilidade intelectiva.
Vai demorar muito para que nós, mentes ainda frágeis e infantis, tenhamos essa maturidade que despreza a concepção humana, paterna e protetora de Deus, para cultivar a concepção avançada de um Zenon, Spinozza ou de um Einstein, que conceberam Deus como uma Grande Mente ou um Logos Spermátikos.
Temos outra opção, enquanto aguardamos uma explicação melhor sobre todas essas coisas: negar, não admitir, não crer, não cogitar, não permitir que essas idéias e reflexões façam parte da nossa experiência cognitiva e ideológica. É também uma forma de compreender o que ainda não é compreensível.
Só que temos um problema: em mentes pacíficas e tranquilas, o ateísmo significa apenas uma aparente indiferença ao universo místico e misterioso da Criação; já para as mentes belicosas e rebeldes ainda predomina o antigo e perigoso conceito materialista: “Se Deus não existe, então tudo é permitido”.
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