Diálogo
no Facebook, à propósito do novo filme de Redley Scott.
Fui ao cinema ver Êxodo. Sala lotada para ver a velha história sob
novos efeitos especiais. Eu e Verônica (minha filha) quase congelamos com o ar
condicionado no máximo. Quem assiste naturalmente fica dividido entre o
mito e a racionalidade desse clássico episódio bíblico. O diretor
Redley Scott, sempre fascinado por antropologia, humaniza Moisés,
atualiza a leitura da bibliografia judaica, porém insiste na
possibilidade humana de sintonizar forças e inteligências de outras
dimensões do universo. Para ele os fenômenos relatados continuam sendo
metáforas de situações-limite da existência. O homem vê Deus como uma
criança petulante e Deus vê o homem como um adulto que não abandonou a
infância. Legal.
Sidnei* -Difícil a relação do homem com Deus, não acha?
Sidnei* -Difícil a relação do homem com Deus, não acha?
Dalmo - Relação de amor e ódio, até que as polaridades se tornem
uma coisa só. Demora milhões de anos.
S- Nós inventamos Deus fora de nós
e o vemos como uma outra pessoa ou outro ser. Na visão de Santo Agostinho isso
é pecado. O que você pensa disso?
D- Agostinho via o pecado como
como um desvio natural que precisa ser corrigido diariamente. Nós não
inventamos Deus, ele sempre esteve em nós. Como somos humanos, Deus obviamente
se torna humano, lutando contra o exterior (os instintos). Se negamos a
razão e
cultivamos a animalidade, Deus desaparece, embora permaneça oculto. Na
medida que avançamos na razão Deus deixa de ser alguém (pessoal) e passa
ser alguma coisa não humana. Kardec pergunta aos Espíritos o que é Deus
e não quem é Deus. Zenon o definiu como o Logos Spermatikus. Nossa
semelhança com Deus é a mente e não o corpo. Spinoza e Einstein definem
Deus com a mente universal.
S- Estava vendo alguns vídeos
ontem que contestam a teoria evolucionista. Inclusive um que afirma que o ser
humano vive na terra há bilhões de anos. E, num certo ponto lá, o autor fala
que admitir a teoria evolucionista seria considerar o homem apenas matéria,
quando na verdade trata-se se matéria, mente e consciência, de acordo com
religião védica.
D- A oposição criacionismo versus
evolucionismo é ideológica e maniqueísta. Darwin só corfirma Deus como uma
inteligência que atua pelas leis da natureza e não como magia simples. A tese
de Teilhard Chardin (Fenômeno Humano) é a que mais se aproxima da leitura
científica. A tradição védica é amelhor de todas elas (Doutrina Secreta de
Helena Blavatsky). A Gênese de Kardec faz uma síntese de tudo isso.
S- No caso, o Autor afirma que a
comunidade científica esconde evidências de forma a manter uma ditadura do
conhecimento e evolucionismo para preservar as suas carreiras. Mas, o que achei
interessante mesmo é que a consciência individual evoluiria também e numa
velocidade diferente do corpo físico, o que justificaria os ciclos e a presença
aqui há muito tempo do que admite a nossa vã filosofia.
D- É provável, pois instituiu-se
uma luta ideológica entre pseudos cientistas e pseudos teólogos. A briga se
enveredou para uma disputa de argumentos sem fim e perdeu o foco e a razão.
Provar versus negar. A evolução da consciência é atemporal, embora precise do
tempo biológico na fase inicial.
S- Agora, como é possível suportar todo o saber e todas as nossas experiências num único corpo físico sujeito ao tempo e numa vida tão curta. Seria preciso muito mais anos ou será que somos tão amaldiçoados que temos apenas que nos conformar com a nossa finitude e as nossas escolhas erradas?
D- Seria impossível. Uma
existência física é um limite para realizar experiências que precisam ser
contínuas, em outras existências. Isso acontece em todas as formas e sêres.
Dormimos no Mineral, sonhamos no Vegetal, acordamos parcialmente no Animal e
finalmente caímos em si no Hominal. E as crises continuam...
S- Difícil. Deus então seria
totalmente racional? Ou melhor, o caminho é através da razão? Como fica a
providência nesse caso, então?
D- Segundo os entendidos é a
Razão, não a razão humana, cheia de lacunas e incompleta. Razão Plena. Somos
uma imitação.
S- A Força, de Guerra nas
Estrelas, por exemplo?
D- Providência são as leis da
Natureza, intervenções espontâneas. A Lei do Amor e da Justiça são expressões
da inteligência divina, provisões divinas para corrigir erros no percurso humano. A
Providência ainda é incompreensível pela razão humana. As "fêmeas"
compreendem, embora não saibam explicar. Elas são um ótimo exemplo de providência,
enquanto os "machos" são exemplos de provisão. Aquele roteiro filmado
por George Lukas é uma metáfora da lei da polaridade universal e quem também se
manifesta no interior humano. No planeta Terra existe o mito dos Dragões se
opondo ao Cordeiro, há muitos milênios.
S- O que é a suposta consciência
da realidade, que leva ao livre arbítrio e etc?
D- Percepção do tempo. Se
entendermos o tempo, assumimos o controle das circunstâncias. A maioria de nós percebe o tempo de forma distorcida e não temos o controle das situações.
S- Percepção do tempo? O que vem a
ser isso? O tempo a que estamos sujeitos?
D- Tempo biológico (cronológico) e
tempo psicológico (mental). Kronos e Kairós dos gregos. A fusão desse dois
tempos é a consciência.
S- Mas, quem é o senhor do momento
oportuno? Nós ou a divindade? Isso causa muita frustração.
D- Creio que é a Divindade,
enquanto nossa percepção for limitada. Ao ampliar a percepção a Divindade
permite o amplo uso do livre arbítrio. Mesmo porque nesse processo contínuo
cometemos tantos erros que seria impossível termos liberdade total de ação.
S- Trata-se então de ampliar a
percepção. Mas essa ampliação não ocorre somente através do livre arbítrio?
Então como atingir? Então a Divindade estaria sendo paternalista conosco?
D- Essa é uma imagem pedagógica
criada por Jesus ou pelos tradutores dos Evangelhos. É uma imagem que se
aproxima muito das tentativas humanas de compreender Deus. O tempo e a
percepção que temos dele é chave do Universo. Einstein não veio ao mundo só
para mostrar a língua.
S- Os próprios princípios da
física quântica, a dualidade onda/partícula e a interferência da observação
humana na formação da realidade. Mas, nada disso dá conta da imensa solidão que
sentimos nessa terra insuportável e do silêncio da divindade. Do jeito que
coisa anda nunca encontraremos Kairós e se encontrarmos não o reconheceremos.
Toda a nossa vida, nossos propósitos, projetos, carreira e tudo o mais está
orientado por Chronos. Ele é o senhor deste mundo: Chronos, o devorador.
D- Inexovável. Mas temos a mente,
inviolável, exclusividade divina em nós. Não dependemos só do relógio. Temos a
Bússola.
S- Acho que eu desanimei.
D- Você sabe que muitos assassinos
(psicopatas) matam porque sentem a ausência da figura paterna ou materna, que
também é incapacidade de compreender Deus. Incapacidade de amar. Os que se
matam também sofrem essa crise. Matar a si é uma tentativa de matar Deus.
S-
Aí a crise já enveredou para a aniquilação do próprio ser. A impressão
que dá é que fomos abandonados aqui e foi dito: se vira malandro, agora é com
você. Tipo jogos vorazes sabe? Onde está o amor em tudo isso? Se formos
analisar bem, este mundo é um absurdo total.
D- Adaptação. Quando Deus quer
falar com o homem de forma mais dura, ele diz: Adapte-se! Assumir o comando da
própria vida é isso.
S- Olha, Dalmo, não tenho dúvidas
que essa experiência nossa aqui é muito enriquecedora. Seria maluco se não
dissesse isso e jamais teria sentido o amor se negasse o fato. Mas, cara, como
é duro.
D- A dor e o destino. Os doze
trabalhos de Hércules.
S- Então, isso que é o ótimo da
coisa. Mas é o medo que dá, a sensação de que a ponte é curta demais, que o
bicho está te alcançando. Isso é que é foda. Vou te falar uma coisa, quando eu
morrer e chegar lá não sei onde e tirar o espectro do meu corpo e ficar somente
o espírito, direi a quem me receber: pô, meu, dá um tempo, a coisa toda é muito
louca.
D- Dá um tempo.... Quanto tempo
mais?
S- A eternidade, eu acho... kkkk
D- Se for preciso. Alguns dizem
temos essa prerrogativa. Outros dizem que não.
S- Acho que o limite é a
paciência. Será que é infinita como o amor ou são a mesma coisa. Acho que não
né, senão não haveria apocalipse e outras ameaças.
D- Os chineses afirmam que a
paciência é a mais difícil das virtudes. Levam-se milênios para se conquistar.
*Sidnei Malena é sociolólogo e advogado. Trabalhamos juntos em São Paulo como educadores na segunda metade década de 1980.
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