sábado, 19 de julho de 2008

Decepções e alegrias da História


A história, quando contada pelos seus próprios atores e agentes, têm o brilho da autenticidade, mesmo que ela desagrade alguns corações e suas respectivas lembranças. Essa foi a impressão que tivemos ao ler pela primeira vez “60 anos de Espiritismo no Estado de São Paulo”, do Dr. Ary Lex.

Há alguns anos, quando buscávamos fontes para compor a nossa "Nova História do Espiritismo", achamos o livro numa pilha de muitos exemplares semelhantes, sendo vendidos a preço de banana num sebo do centro paulistano. Nossa história sendo vendida a 4 reais nos deu a alegria da oferta e do achado , mas também a tristeza de constatar o desinteresse e o desprezo pela memór
ia do Espiritismo. O autor provavelmente só conseguiu publicar o livro por causa do seu prestígio junto a então diretoria FEESP, já que, certamente, nenhuma editora correria o risco do encalhe. Nosso exemplar insignificante, retirado daquela imensa pilha escondida nos fundos da livraria de usados, hoje é destaque em nossa modesta estante doméstica, cheio de anotações à lápis. É leitura fundamental para quem pretende defender ou atacar o Espiritismo.

Um detalhe: o sub-título "Nossa Vivência" é uma alfinetada no manual "Vivência do Espiritismo Religioso", com autoria de Edgard Armond, atribuída pelos diretores da Aliança Espírita Evangélica.

Merece atenção também a forma como o Dr. Ary Lex analisava o problema do ensino espírita, assunto em que desenvolveu opinião curiosa quando tomou parte nas tentativas de materialização de projetos educacionais, como a chamada “pedagogia espírita”.

Surpreendentemente, ele não compreendia a educação andragógica ou iniciática, quando tornou-se um crítico curricular das Escolas de Aprendizes do Evangelho, embora admitindo sua grande eficiência técnica e social. Mas também não conseguia enxergar nem as raízes e muito menos os rumos da educação pedagógica, na época objeto de grande interesse idealístico de J. Herculano Pires.

Não conhecemos pessoalmente o Dr. Ary Lex, mas muito ouvimos falar da sua fama de purista doutrinário, polemista e eterno desconfiado das manifestações mediúnicas. Para ele , Ismael era simplesmente “aquele espírito mentor da FEB”. Por outro lado, tinha um enorme respeito, quase místico, pelas receitas do Dr. Bezerra de Menezes.

Um antigo livreiro, bastante conhecido, nos contou que, em certa ocasião, Ary Lex fez uma lista de erros científicos contidos nas obras de André Luiz, incluindo os de anatomia. A crítica certamente não se limitava a esse aspecto e avançava no terreno das “revelações”. O Espírito reagiu e mandou um recado para o Dr. Ary dizendo que, se toda a obra escrita por ele através de Chico Xavier não tivesse algum valor no seu conjunto, então ele não se importaria se a mesma fosse jogada no lixo...

Evidentemente esse episódio, como tantos outros, não está no livro, mas nele encontramos muitas preciosidades para reflexão, sobretudo as que desmistificam personalidades “sacralizadas” no Movimento Espírita.

Aliás, essa é a temática central da obra, assunto que mais o incomodou durante a sua trajetória como militante. Já na empolgante introdução, como aviso do que vai acontecer nas próximas 180 páginas, ele propõe, bem ao estilo médico-positivista, uma curiosa tipologia da militância espírita com que se deparou nessas seis décadas de percurso. Nela identificamos claramente as nossas reminiscências e tendências, incluindo o próprio estilo e características do autor. Quando tivermos alguma dúvida sobre as nossas atitudes perante a doutrina, às instituições e aos companheiros de jornada, seria muito útil consultar esses perfis e rever as nossas posturas.


TIPOLOGIA LEXIANA


“Conhecemos muitos tipos de pessoas:

- as TÍMIDAS, que freqüentam ambientes espíritas durantes anos, sem manifestar suas opiniões;

- as EXTROVERTIDAS, sempre falantes, com muitas idéias, mas sem realizações práticas;

- as SONHADORAS, com planos mirabolantes e inexeqüíveis, querendo modificar tudo e criar estruturas obras faraônicas;

- as DITADORAS, que não admitem qualquer contestação às suas idéias;

- as IRRITADAS, sempre contra tudo e contra todos;

- as MÍSTICAS, que buscam um Espiritismo que se assemelhe ás práticas de antes, cheias de rituais, substituindo os santos pelos guias e os deuses pelos espíritos desencarnados;

- e , finalmente, as EGOÍSTAS, que não perdem a oportunidade para a sua auto-promoção".

Nenhum comentário: