sexta-feira, 1 de maio de 2009

O medo, a necessidade e a dúvida

A pequena atriz Ivana Baquero interpretando a imaginária princesa Ofélia. O filme de Guillermo del Toro é uma ótimo pretexto para discutir e compreender as verdades universais do Espiritismo.


Entender e compreender sempre foram coisas diferentes no esforço humano para ler o grande texto do mundo. Os fenômenos que brilham diante dos olhos nem sempre repercutem da mesma forma nas mentes e nos corações. São ritmos de amadurecimento que os gregos antigos diferenciavam utilizando a metáfora do tempo: kronos, para as coisas exteriores e kairós, para as coisas interiores. É assim que o Criador permite que as criaturas conheçam a natureza que está fora e dentro delas mesmas, o Uno e o Verso. Tudo isso pode parecer complicado, mas é só aparência ou ilusão. Tudo se descomplica quando a vida flui com simplicidade, mesmo quando tudo se mostre de forma complexa e inatingível. Não são as coisas, somos apenas nós, nos debatendo para aceitar a verdade.


“Há muito, muito tempo no Reino Subterrâneo, onde não existem mentiras ou dor, viveu uma princesa que sonhava com o mundo dos humanos. Sonhava com o céu azul, a brisa suave e o brilho do sol. Um dia, burlando toda a vigilância, a princesa escapou. Uma vez do lado de fora, a luz do sol a cegou… e apagou da sua memória qualquer indício do seu passado. A princesa esqueceu quem era e de onde veio. O seu corpo sofria de frio, doença e dor. E no decorrer dos anos, ela morreu. Entretanto, seu pai, o Rei, sabia que a alma da princesa retornaria, talvez em outro corpo, em outro lugar, em outra época. E ele esperaria por ela, até seu último suspiro, até que o mundo parasse de girar…”

Assim , com esse relato cheio de simbologias e mistérios, começa a fantástica narrativa fílmica do diretor Guillermo Del Toro. A película foi concebida originalmente como metáfora política das lutas entre o totalitarismo e a liberdade na Espanha dos anos 1940, quando o país sofre a sua mais terrível prova desde a decadência mercantilista. Após o conflito civil que matou mais um milhão de pessoas e também serviu de ensaio para a II Guerra Mundial, o país mergulha nas trevas do fascismo franquista. Mas ainda há a resistência dos guerrilheiros esquerdistas escondidos nas montanhas. É nesse ambiente repleto de perigos, mistérios e ciladas que acontece essa enigmática fábula que fala da educação do corpo e da alma. Ensina pela linguagem artística o que é e com funciona a educação iniciática, essa andragogia secreta do mundo íntimo, que acontece paralelamente na experiência social humana. Muito útil para a compreensão da moral e das verdades universais do Espiritismo. Atentem para o nome e as características do livro que a menina Ofélia recebe do Fauno e como acontecem as revelações contidas nele.

Diferente dos graus horizontais e previsíveis da pedagogia intelectual, a graduação andragógica ou espiritual ocorre no terreno vertical do imprevisível, como na Parábola do Semeador. A sala de aula é a Natureza e as lições são as circunstâncias da vida. Não há como fugir sem pagar o terrível preço da alienação. É o ser e o destino. O primeiro grau é a água (neutra, indefinida e sem gosto), o segundo é a lama (tem gosto, mas ainda está indefinido entre o sujo e o limpo) e finalmente o terceiro grau: a luz, que se define e distingue completamente dos demais, por que não mais se suja ou é impedido por nada que seja material.

Entre esses três graus de transformação pessoal, ocorrem as provas mais terríveis da experiência humana: a necessidade, o medo e a dúvida. São as três fases do relógio da existência (infância, vida adulta e velhice) numa só circunstância consciencial (a bússola). Passando pelas provas vivenciais da iniciação andragógica, atinge-se respectivamente a pureza das crianças, a coragem dos adultos e a serenidade do mais velhos. Não importa se somos crianças ou adultos, pois a iniciação não depende somente do intelecto ou da experiência do mundo social, mas principalmente do sentimento da coragem e os valores positivos da emoção, ou seja, da capacidade de fazer escolhas e usar o livre arbítrio. Não importam as situações, não importam as aparências, as tradições e os preconceitos. O que vai predominar é sempre a verdade, custe o que custar.

Como bem disse alguém na internet:“O Labirinto do Fauno" deve ser apreciado com muita atenção, os detalhes importantes estão meio que escondidos. E cabe cada um decidir o que é real e o que não é”.


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