sábado, 13 de março de 2010

A mensagem de Clara


Querida Maria:

Eu pressentia que o encontro através das notícias seria primei­ramente com você. Somente você teria disposição de via­jar de Caetanópolis até aqui, no objetivo de atingir o nosso intercâmbio.Descrever-lhe o que se passou co­migo é impossível agora. Aquela aneste­sia suave que me fazia sorrir se trans­formou numa outra espécie de repouso que me fazia dormir.

Sonhava com vocês todos e me via de regresso à infância.Era uma alegria que me situava num mundo fantástico.Melodias e cores, lembranças e vozes se mesclavam e eu me perdia naquele estado desconhecido.Não cuidava de mim. Lembrava-me dos que ficavam, mas ainda não sabia se a mudança seria definitiva.

Acordei num barco engalana­do de flores, seguido de outras embar­cações, nas quais muitos irmãos entoa­vam hinos que me eram estranhos. Hinos em que o amor por Iemanjá era a tônica de todas as palavras. Os amigos que me seguiam falavam de libertação e vitória.

Muito pouco a pouco me conscientizei e passei da euforia ao pranto da saudade, porque a memória despertava para a vida na retaguarda e o nosso Paulo se fazia o centro das minhas recordações. Queria-o ali naquela abordagem maravilhosa, pois os barcos se abeiravam de certa praia encantadoramente enfeitada de verde nas plantas bravas que as guarneciam.

Quando o barco que me conduzia ancorou suavemente, uma entidade de grande porte se dirigiu a mim com paternal bondade e me convidou a pisar na terra firme. Ali estavam o meu pai Manuel, e nossa Mãezinha Amélia. Os abraços que nos assinalavam as lágrimas de alegria pareciam sem fim. Era muita saudade acumulada no coração. Ali passei ao convívio de meus pais e os meus guardiões retornavam ao mar alto.

Retomei a nossa vida natural e, em companhia de meu pai, pude rever você e os irmãos todos me comovendo ao abraçar a nossa Waldemira, que me pareceu um anjo preso ao corpo.

Querida irmã, não disponho das palavras exatas que me correspondam às emoções. Peço a você reconfortar o nosso Paulo e dizer-lhe que não perdi o sonho de meu filhinho que nascesse na Terra de nossa união e de nosso amor. O futuro é luz de Deus. Quem sabe, virá para nós uma vida renovada e dife­rente pa­ra as mais lindas reali­zações?

Você diga ao meu poeta e letrista querido que estou contente por vê-lo fortalecido e resistente, exceção fei­ta dos "co­pi­nhos" que ele conhece e que es­tou vendo agora um tanto aumentados... Desejo que ele saiba que o meu amor pelo esposo e noivo permanente que ele continua sendo para mim, está brilhando em meu coração, que con­tinua cantando fora do outro coração que me prendia.

A cigarra, por vezes, canta com tanta persistência em louvor a Deus e a Natureza, que se perde das cordas que coordenam a cantiga, caindo ao chão, desencantada. O meu coração da vida física não suportou a extensão das melodias que me faziam viver, e uma simples renovação para tratamento justo me fez repousar nas maravilhas diferentes a que fui conduzida.
Espero que o nosso Paulo consiga ouvir-me nestas letras. Agradeço a ele as atitudes dignas com que me acom­panhou até o fim do corpo, tanto que agradeço a você e as nossas irmãs e ir­mãos o respeito com que me honraram a memória, abstendo-se de reclamações in­débitas junto aos médi­cos humani­tários que se dispuseram a servir-nos.
Querida irmã, continue com o nosso grupo em Caetanópolis. O irmão José Viana e o Dr. Borges estão conquistando valiosas experiências. Muitas saudades e lembranças a todos os nossos e para você um beijo fraternal com as muitas saudades de sua, Clara.

Mensagem da cantora Clara Nunes através de Chico Xavier, recebida em 15 de setembro de 1984 no Grupo Espírita da Prece, Uberaba –MG.

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