quinta-feira, 9 de julho de 2009

Brasil coração do mundo, país do futuro

World weariness weltschmerz, por Ludvik Glazer-Naude


O escritor Stefan Zweig era um judeu nascido na Áustria, porém mantinha aceso o espírito da Diáspora. No período entre guerras ele percebeu o perigo de uma grande tragédia para a sua raça e aderiu ao movimento de criação de um Estado judeu para acolher os seus irmãos dispersos. A idéia desse Estado não era exclusivamente voltada para a região da Palestina, mas em qualquer lugar onde o povo da diáspora pudesse reconstruir o território perdido com a destruição de Jerusalém em 175 dC. Desde essa data fatídica, quando o imperador Adriano pôs fiz ao sonho da posse política do suposto messias Bar Kosiba,
os judeus tornaram-se um povo errante, sem pátria, alvo fácil das perseguições dos inimigos. Isso os obrigou a desenvolver hábitos defensivos e uma forte cultura voltada para a sobrevivência da raça e das suas tradições. A grande experiência deles com os negócios de economia livre e essencialmente financeira provavelmente veio dessa instabilidade e dos riscos de roubos e pilhagens que ameaçava constantemente seus patrimônios. Tem início então o período mais dramático da história dos judeus desde o Êxodo do Egito.

Zweig fazia parte desse grupo que buscava a utopia sionista e utilizava o seu prestígio de escritor internacional para promover esse ideal. Segundo o jornalista carioca Alberto Dines, profundo estudioso da dessa experiência Zweig, o escritor viu no Brasil a possibilidade de realizar esse sonho e por isso escreveu “Brasil, país do futuro”, entre 1937 e 1940. O livro foi produto não somente dessa intenção de abrir um espaço de refúgio, mas também agradar a política ufanista do Estado Novo. A reação dos intelectuais de esquerda contra Zweig foi muito negativa e acentuava maldosamente essa associação entre ele e o regime ditatorial de Getúlio Vargas. Ainda hoje o livro é lembrado com ironia quando alguém quer ridicularizar o desenvolvimento do Brasil. Postura injusta e insensível. No prefácio da primeira edição Afrânio Peixoto afirma que Zweig escreveu um desintessado e verdadeiro poema de amor pelo Brasil. Vamos mais longe: através da intuição Zweig pode ter tido acesso às mesmas fontes inspiradoras que motivou Humberto de Campos na elaboração de Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, publicado pela FEB em 1938. Este também sofreu e ainda sofre um intenso repúdio dos intelectuais espíritas, fazendo a mesma associação bajuladora com o ufanismo do Estado Novo. O livro psicografado pelo jovem médium Chico Xavier mostra uma grande conspiração espiritual comandada por entidades da tradição israelita (Jesus, Helil, Ismael) influindo na criação de uma nova Canaã em terras brasileiras. A semelhança conjuntural, temática e ideológica entre as duas obras é impressionante, com a ressalva de que Zweig foi mais a fundo na sua pesquisa e lamentava não ter tido “tempo” para corrigir as falhas que cometeu em sua análise sobre o país. Tinha pressa em difundir esse material em várias partes do mundo. Alberto Dines diz que o grupo de Zweig pretendia também criar um território judeu na África, possivelmente em Uganda, onde já havia colonos indianos e que mais tarde seriam expulsos pelo governo criminoso de Idi Amin. Outra possibilidade era a Argentina. Zweig visitou e depois fixou-se no Brasil em 1940 concentrando suas energias diplomáticas para abrir as portas à imigração judaica.

Mas, como todos sabem, as coisas não aconteceram como Zweig sonhava. O Zeppelin havia visitado o Brasil em 1933. Era um sinal das grandes provas que estavam por vir. A expansão do nazismo na Europa e as hostilidades contra os judeus se ampliaram no mundo inteiro, incluindo no Brasil. Era uma época de muita apreensão e tal sentimento se confirmaria com o genocídio de milhões de judeus nos campos de concentração. Muito sensível, afetado por essas graves mudanças e também deprimido pelas reações negativas quando da publicação do livro no Brasil, Zweig e sua mulher Lotte suicidaram-se na casa onde moravam em Petrópolis. Morreram abraçados e a fotografia dessa tragédia foi estampada em praticamente todos os jornais da época.

Será que Zweig pôde assistir em espírito a criação do Estado de Israel durante a assembléias da ONU em 1948, presidida pelo de descendente de cristãos novos Oswaldo Aranha? Será que Zweig ficaria satisfeito com o retorno dos judeus para a Palestina?

No final do seu livro Stefan Zweig deixou um adendo denominado “Despedida”, no qual escreveu:

“Quem visita o Brasil, não gosta de o deixar. De toda a parte deseja voltar para ele. Beleza é coisa rara e beleza perfeita é quase um sonho. O Rio, essa cidade soberba, torna-o realidade nas horas mais tristes. Não há cidade mais encantadora na terra”.

Brasil Coração do mundo, publicado em 1938 e as edições de Brasil País do Futuro. Abaixo Zweig com Lotte e a notícia do suicídio.

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