sábado, 12 de janeiro de 2008

Mistério na cratera do metrô


Os leitores imaturos de Sherlock Holmes, eternos dependentes da ilusão e da fantasia, não perdoam Arthur Conan Doyle pela sua adesão ao Espiritualismo. Poderiam evitar o tema, já que a carreira literária do escritor inglês nesse segmento é praticamente insignificante aos que não se interessam pelo assunto.

Mas quem resiste a oportunidade de uma alfinetada na Doutrina dos Espíritos?

O jornalista Sergio Augusto, repetindo cansativamente todos os seus colegas, ao se referirem ao escritor inglês, escreveu esse trecho infeliz na sua curiosa matéria publicada como “especial” no jornal O Estado de São Paulo (Mistérios do mais genial detetive, sábado,12/01/2008): “Conan Doyle morreu comprometidíssimo com mágicas e espiritismo”, citando o livro de Massino Polidoro, lançado em 2001.
Nenhum desses analistas se deu ao trabalho de ler sua História do Espiritualismo, nem as demais obras, pois, nesse aspecto, consideram Doyle um simples ingênuo e sofredor atormentado pelo morte do filho na I Guerra Mundial. De “genial” a retardado a distância é curta, simplesmente porque o Espiritismo é comprometedor... Os analistas também não contam que a amizade de Doyle com o mágico Harry Houdini azedou porque o famoso ilusionista se sentiu acuado ao levantar-se a hipótese de que suas “mágicas” eram na verdade produto de uma provável mediunidade de efeitos físicos. Contra fatos não há argumentos que resistam, nem mesmo uma bela amizade.

Mas, ódios, ironias e interesses à parte, que tal invocar o Espírito de Sherlock Holmes para desvendar o mistério da van tragada pelo buraco do metrô em São Paulo?



Coincidências selaram destinos no microônibus

Felipe Grandin

Uma série de coincidências levou a van 26457, que fazia a linha Casa Verde-CPTM Pinheiros, da cooperativa Transcooper, a cair na cratera do canteiro de obras da Estação Pinheiros, há um ano. Quase um ano depois, colegas do motorista Reinaldo Aparecido Leite, 40 anos, e do cobrador Wescley Adriano da Silva, 22, dizem que as vítimas tiveram ao menos quatro chances de mudar sua sorte. No veículo ainda estavam os passageiros Márcio Alambert, 31 anos, e Valéria Marmit, 37. Todos morreram.

A primeira oportunidade de escapar apareceu quatro dias antes. Leite e Silva tinham dito a colegas que queriam parar de trabalhar na van 26457 - como a empresa é uma cooperativa, os veículos pertencem a pessoas diferentes. Naquele dia, foram chamados para trabalhar em outro microônibus. "Eles acharam que iam se 'queimar' com o patrão e desistiram", diz Sérgio Pires, 24, que fez o convite.

No dia do acidente, o motorista só começou a trabalhar às 13h40, com 40 minutos de atraso. O cobrador ficou esperando. Se tivesse chegado na hora, Leite teria entrado em outro lugar na escala do dia.

Por volta das 13h, outra mudança na rotina. A van do motorista William Barbosa, 30 anos, chegou ao ponto final na Casa Verde. Cansado, ele pediu para almoçar. "Eu não ia poder (sair para almoçar) porque só tinha nosso carro no ponto", lembra. "Era a minha vez de sair, mas o 457 chegou, e fui comer."

O 26457 parou no ponto final, na Casa Verde, às 13h25, conduzido pela motorista do turno da manhã. Dois minutos depois, chegou outro carro, o 26199. O fiscal Claudeci Pereira, o Cal, se enganou. Trocou os horários e a ordem de partida (veja reprodução abaixo). Leite e Silva esperaram a primeira van sair e seguiram oito minutos depois, às 13h54. Foram até Pinheiros e, na volta, caíram no buraco. A soma desses detalhes foi determinante para que, às 14h53 de 12 de janeiro de 2007, o veículo passasse no trecho exato da Rua Capri em que se abria a cratera.

Estadão, Sábado, 12 de Janeiro de 2008 - Versão Impressa

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