sábado, 15 de agosto de 2009

O importante e o essencial


Apesar de nós, o Espiritismo segue o seu caminho. Podem falar , reclamar, espernear, mas o que existe ainda de mais eficiente em forma de divulgação da doutrina continua sendo o exemplo moral.

Se o Espiritismo dependesse dos intelectuais e comunicadores de plantão (a maioria provavelmente antigos sacerdotes fracassados e caluniadores, hoje disfarçados na carne) estaria em sérias dificuldades. Com exceção da enxurrada de livros de fácil entendimento, nos parece que o público não está nem aí para o que se publica sobre a doutrina nas revistas, jornais, blogs ou programas de rádio e TV especializados.

Simpatizantes que não têm compromisso "cármico" com o Espiritismo costumam ser mais competentes do que os especializados. Em apenas alguns minutos Ana Maria Braga conseguiu ser mais eficiente que todos nós em décadas de blá, blá,blá colocando no seu programa gente para dar depoimentos vivenciais sobre o assunto. O filme de Daniel Filho, que não é espírita de carteirinha, segue a mesma trajetória de eficiência. Diferente deles, que não são divulgadores espíritas, somos repetitivos e quase sempre chovemos no molhado, divulgando o Espiritismo para os espíritas. O que fazemos, na verdade , com toda essa poluição e congestionamento de informações doutrinárias, é apenas uma troca de impressões entre nós mesmos.

Mas isso não é algo tão ruim a ponto de pararmos de fazer o que estamos fazendo. Podemos continuar tentando ser melhores, desde que conscientes das nossas limitações e risco de sermos pretensiosos. Do contrário, estaremos apenas nos convencendo de que a nossa ideologia precisa ser alimentada de alguma forma, para nós mesmos.

Por tudo isso é que o exemplo moral é sempre mais eficiente. E exemplo significa, entre outras coisas , a boa e rápida preleção doutrinária e principalmente o passe, as mais simples e tradicionais portas de entrada do centro espírita e do Espiritismo. Isso mesmo: passe não pode faltar e preletor tem que ser rápido e autêntico, em qualquer circunstância ou veículo. Certa ocasião em 1998, quando residimos na região centro-oeste Brasil, assistimos a uma preleção muito enrolada – o orador falava daquela história das pegadas na praia, de escrever o nosso destino na areia, etc - e não conseguia terminar. O dirigente do trabalho levantou e concluiu a preleção falando da necessidade sermos simples e verdadeiros. E depois finalizou: “Olha, se alguém precisar, tenho um amigo que tem um caminhão de areia e cobra bem baratinho”.

Na mesma noite fomos convidados pelo dirigente para fazer a preleção da semana seguinte. Antes de aceitarmos o convite ele nos alertou: “Você já sabe como as coisas funcionam aqui. Vá direto ao assunto e fale somente o necessário”. Esse centro, muito frequentado, ficava na periferia da cidade e tinha um jeito prático de fazer caridade. Esse mesmo dirigente, um capitão aposentado, fosse qual fosse o evento, pedia a palavra e fazia os seus pedidos: “ Tem ali fora uma família abandonada e que precisa comprar três passagens de ônibus. Eles vão embarcar ainda hoje. Preciso de 45 reais. Quem pode colaborar? Se não conseguisse , dispensava o atendido dizendo para procurar outro lugar pois não foi possível ajudar naquele momento e que iria orar por eles. Tinha tantos casos, de todos os tipos, que ele desenvolveu esse método simples e objetivo e, embora sendo assistencialista, concentrava-se em situações transitórias dos assistidos. Quando o conhecemos ele estava acompanhado de um sujeito perturbado e alcoólatra, hóspede do albergue que funcionava ao lado do centro. O Capitão dizia para ele : “Vai fazendo alguma coisa por aí. Pegue uma vassoura, arrume as cadeiras. Não fique parado”. Quando o rapaz se afastou, ele no confessou “ Esse aí aprontou pra muita gente. Tem uma legião no encalço dele. Vamos ver se daqui algum tempo ele consegue fazer pelo menos uma oração”. Para o Capitão, o essencial naquele momento era manter o sujeito ocupado e ensiná-lo a orar. O resto podia esperar. O resto seria os estudos, os eventos culturais, a formação de voluntários, etc.

Também nesse mesmo centro, certa noite, após terminarmos uma preleção sobre ressurreição, nos aconteceu algo muito curioso. Estávamos indo em direção ao carro quando demos de cara com uma mulher atormentada, dizendo que precisava ir até uma casa de massagem e pedia que nós a levassemos até esse local. Vendo que não nos decidíamos, a mulher continuou andando até desaparecer na rua escura. Tivemos a nítida impressão de que era alguém desencarnado que não aceitava a morte. Mas ao mesmo tempo era tão real que ficamos confusos e paralisados. Não conseguiamos falar, nem nos decidir. Não aprendêramos a lição e, portanto, não conseguimos colocar em prática. Casa de ferreiro, espeto de pau.

O contato mediúnico simples e honesto com os Espíritos continua sendo eficiente também. Acabemos com tudo isso – confiando somente nas maravilhas tecnológicas e na retórica reproducionista dos pseudo-sábios encarnados - e veremos o Espiritismo ir para o buraco negro pelo qual já se perderam as grandes filosofias e religiões que uma dia embalaram os sonhos de felicidade humana. Tratemos os médiuns e servidores espíritas como oráculos e sacerdotes e logo vamos perceber as nossos centros serem transformados em covis de mistificadores e mercadores da fé. Deixemos de fazer uma oração para alguém que está necessitado, ignoremos uma boa conversa na qual seremos sempre ouvintes respeitosos, comportemo-nos como se comportam a maioria dos egoístas do mundo e veremos todos os esforços dos Espíritos e dos militantes heróicos que nos antecederam irem por água abaixo.

O que fazemos hoje pela divulgação do Espiritismo é sem dúvida importante para a sua difusão. Mas – como já dissemos – é só importante. Tanto é que constantemente caímos no grave erro de achar que estamos sendo muito muito mais do que importantes e sem a coragem de nos questionarmos se estamos sendo realmente essenciais.

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